O Ovo da Serpente
Rating
Total
Minha relação com Ingmar Bergman não é das melhores. Jamais gostei de seus filmes (odiei Porto e Um Barco para a Índia, gostei mais de O Sétimo Selo e até “aprovei” Morangos Silvestres). Mas tenho de dar o braço a torcer. Enfim gostei bastante de um de seus longas! Ok, é a obra que ele credita como sua pior. Mas é dele. O Ovo da Serpente é muito bom, Bergman!
Quem gostou do mais recente A Fita Branca tem o dever de assistir a O Ovo da Serpente, que é melhor (essencialmente por ser mais direto, mesmo tratando tudo como um pano de fundo). A temática é a mesma, debruçando-se sobre o pré-nazismo, a origem do regime de Adolf Hitler. Produzido em 1977 pelo italiano Dino de Laurentis (de clássicos como Veludo Azul e Conan, O Bárbaro, além de filmes dos conterrâneos Federico Fellini, Roberto Rosselini e Mario Monicelli), o filme não agradou Bergman especialmente devido às brigas que teve no set com David Carradine (o Bill de Kill Bill), o protagonista. Por exemplo: o diretor queria matar um cavalo diante das câmeras, mas Carradine avisou que, se isso ocorresse, abandonaria a produção (apesar de ter aceito a imposição, o cineasta matou um cavalo e parte de seu corpo foi oferecido por um homem miserável para o personagem de Carradine).
Mas Bergman também rechaçou o filme por ter um foco na narrativa, em detrimento do cinema mais contemplativo que o diretor sueco adorava. É exatamente o que não gosto nos filmes dele: esse negócio de o filme não “andar” me dá aflição!
O Ovo da Serpente retrata uma sociedade alemã à beira do caos econômico e político e demonstra como, sob essas circunstâncias, é possível nascer um movimento terrível como o nazismo. Estamos em novembro de 1923, no rescaldo da Primeira Guerra Mundial. Bergman faz poucas menções diretas a Hitler e ao Partido Nazista, mas ainda assim conseguimos percebê-las.
Carradine vive Abel Rosenberg, um trapezista americano que logo de cara encontra seu irmão morto com um tiro na cabeça. Judeu, Abel passa a resolver questões pendentes de seu irmão. Aí fica com a pulga atrás da orelha, intuindo que há algo por trás da morte do parente, um homem feliz e com dinheiro, sem motivo para se matar. Abel se junta à ex-cunhada, Manuela (interpretada por Liv Ulmman, com quem Bergman teve uma filha), que já estava separada de seu irmão, tentando sobreviver. Ambos sofrem assédio do tal Hans Vergerus, um enigmático cientista que sem motivo aparente oferece ajuda a Abel e Manuela.
O que O Ovo da Serpente mostra – como A Fita Branca – é que dez anos antes da subida dos nazistas ao poder já se podia ver um fantasma rondando as vielas da Alemanha. Uma semente de radicalismo e violência estava brotando.
É curioso como o filme mostra a ilusão dos alemães contrários a Hitler com uma derrota imposta ao futuro ditador – chamada de Putsch da Cervejaria, em 9 de novembro de 1923. Nessa data, aniversário de cinco anos da Declaração da República de Weimar, Hitler e as milícias alemãs tentaram iniciar uma marcha militar com o objetivo final de ocupar Berlim e estabelecer uma ditadura nacional-socialista. Desta vez, não deu certo.
Como o cientista Hans Vergerus diz no filme: “é como o ovo de uma serpente. Através das finas membranas você pode claramente discernir o réptil já perfeito”.
O Ovo da Serpente / The Serpent’s Egg
CLASSIFICAÇÃO: DUCA
Ficha técnica:
Direção: Ingmar Bergman
Roteiro: Ingmar Bergman
Elenco: David Carradine, Gert Fröbe, Liv Ullmann, Christian Berkel e James Whitmore
Gênero: Drama
Ano: 1977