Isto Não É Um Filme
Rating
Total
Já havia assistido a um filme do iraniano Jafar Panahi, O Balão Branco, sem ficar encantado. Bom longa, mas sem algo que me marcasse. Ao ver o trailer de Isto Não É Um Filme caí em outra obra do diretor e roteirista. E esta, sim, é marcante! Arrisco-me a escrever que difere de tudo que já foi produzido no cinema.
Jafar Panahi é um cineasta censurado. Seus filmes sempre abordaram a questão política do Irã, mesmo que indiretamente. Por isso (como se isso fosse realmente um motivo), e por condenar o regime totalitário dos aiatolás (filmou os protestos de rua contra o governo de Mahmud Ahmadinejad), foi preso e, sob protesto de artistas do mundo todo (como Steven Spielberg e Juliette Binoche), só saiu dois meses depois, após uma semana de greve de fome e o pagamento de fiança equivalente a 200 mil dólares. Ainda assim, recebeu condenação de seis anos em prisão domiciliar. E por 20 anos está proibido de escrever roteiros e atuar como diretor.
É claro que Panahi está infeliz. Mas resolveu não se curvar e, como uma espécie de porta-voz de todos os diretores iranianos que se encontram em situação semelhante, criou este “não-filme”. Como o próprio diz ao passar dos minutos, ele está proibido pela Justiça de ser diretor ou escrever roteiros, mas nada o impede de ser filmado por um amigo e de ler um próprio roteiro já escrito.
Assim, Panahi torna-se ator em Isto Não É Um Filme. A autoria do filme não engana ninguém, mas ele tenta manter-se oficialmente longe da direção. No Festival de Cannes, que aclamou o filme em 2012, ele e seu “câmera-man” Motjaba Mirtahmasb foram devidamente creditados como diretores. Mas ele, claro, não compareceu – foi deixada uma cadeira vazia pela organização do festival em sua homenagem.
Em frente à tela, Pahani mostra um dia em sua vida e tenta fazer um filme-dentro-do-filme: inicia a encenação de uma obra sua censurada, na qual uma moça é trancada em casa pelo pai (qualquer semelhança NÃO é mera coincidência). A encenação é em seu apartamento, precisamente em um tapete “recortado” por fitas-crepe, com a suposição de que o espectador pode imaginar o que ele narra. Panahi ainda mostra referências de outros filmes, em DVD, tentando facilitar a vida de quem assiste a seu filme-dentro-do-filme. Em um certo momento, percebe que não conseguirá fazer uma obra sem atores e restrito a um tapete. E se desespera. Lá para o fim, aproveita a oportunidade de seguir um jovem rapaz que vem retirar o lixo de seu apartamento e, assim, criar uma história. Este homem encanta em uma descida de elevador.
Interessantes também são os créditos finais, cheios de vazios, até mesmo nos agradecimentos a artistas iranianos.
Claro, o que vale em Isto Não É Um Filme é a história de Pahani e sua vivacidade em encarar um regime nefasto. Não importa se tecnicamente a obra tem qualidade! Poucos meses depois do filme, a sentença do diretor foi confirmada pela Justiça (justiça?) iraniana. Agora, o processo entra em fase de “execução do veredicto”, o que significa que ele pode ser preso a qualquer momento. Um quadro, como se sabe, com poucas esperanças. Seu colega de filmagem, Mojtaba Mirtahmasb, teve o passaporte confiscado quando tentava embarcar para Paris com a esposa e o filho, que seguiram viagem. Foi proibido de sair do Irã e teve seus pertences pessoais (computador, caderno de notas) retidos pelas autoridades.
Isto não é um filme, é história real. Infelizmente.
Isto Não É Um Filme / In Film Nist
CLASSIFICAÇÃO: PARE TUDO E VÁ VER
!
Ficha técnica:
Duração: 75 min.
Ano: 2011
Gênero: Documentário
Direção: Mojtaba Mirtahmasb e Jafar Panahi
Roteiro: Jafar Panahi
Montagem: Jafar Panahi
Produção: Jafar Panahi
Como lidar inteligentemente com algo estúpido. Sim, o filme é simples assim. Simples, mas profundo. E nos faz pensar como o Brasil pode fazer "política" com um país com o Irã. Até entendo fazer negócios, mas não manter laços que incluam a sua defesa indefensável.